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“Não troco meu “Oxente” pelo “ok” de ninguém” – Ariano Suassuna

segunda-feira, 9 de janeiro de 2012

A PARTICIPAÇÃO DO ELEITORADO NO PROCESSO DE CORRUPÇÃO ELEITORAL À LUZ DA LEGISLAÇÃO E DA CULTURA

Derly Pereira Brasileiro

Resumo
O presente trabalho realiza uma abordagem de análises legais e doutrinárias a respeito dos crimes eleitorais
praticados pelo eleitor brasileiro em face da legislação brasileira em vigor e após o processo eleitoral de 2010.
Nesse sentido, ele analisa a participação dos eleitores no processo de corrupção, envolvendo causas e
conseqüências dessas condutas criminosas no contexto político-eleitoral. Através das discussões que envolvem o
tema político e com base em pensamentos maquiaveliano e popular de que não importa a conduta, mas os
resultados das ações, tem o trabalho amparo em pensamentos históricos e culturais. A pesquisa tem como base
metodológica a pertinência da lei e a doutrina para que seja investigada a visão do eleitor sobre o caso. Os
dados avaliados fornecerão elementos necessários a uma contribuição para estudos futuros e auxiliarão os
estudiosos e pesquisadores em investigações mais exaustivas sobre o tema. Com isto pretende-se avaliar a
questão da participação do eleitor como contribuinte de uma cultura corruptiva, fomentadora das ações
criminosas promovidas pelos agentes políticos.
Palavras - chave: Eleitor. Crimes Eleitorais. Corrupção. Cultura.
Introdução
Há um ditado popular no Brasil que diz: “rouba, mas faz” e que está diretamente
relacionado a uma cultura disseminada ao longo da história do País no sentido de que não
interessa se um gestor público cometa atos ilícitos, o que importa é que realize ações na
Administração.
Tomando por base esse pensamento, percebe-se que em meio a história do País o
brasileiro é capaz de realizar diversas ações com o fim de encontrar os meios necessários a
sua sobrevivência, destacando-se nessas ações o cometimento de condutas contrárias às leis
existentes, ou mais especificamente os crimes.
Refletindo o dito popular acima, Calhau (2007) afirma ser o crime um fenômeno
humano e cultural, e segundo Martin (1992) toda manifestação cultural não pode ser
entendida fora do contexto no qual é representada.

1 Delegado de Polícia Federal, Especialista em Direito Penal e Criminologia, Especialista em Segurança Pública.
E-mail : pfbrasileiro@yahoo.com.br

Nesse prisma, no Brasil, no que concerne ao processo de escolha e eleição dos
representantes do povo, através de serviços eleitorais próprios, existem normas que
disciplinam as condutas eventualmente praticadas por eleitores que passam a ser consideradas
como criminosas e passíveis de aplicação de punição.

A legislação eleitoral brasileira, estudada no âmbito do Direito Eleitoral, procura
proteger todo o processo de escolha dos representantes do Estado (nas esferas federal,
estadual e municipal), a exteriorização dos direitos políticos, o próprio procedimento eleitoral
através das eleições e sua transcorrência normal, tudo com o fim de dar maior legitimidade ao
processo de escolha dos representantes públicos.

Como será visto, o ordenamento jurídico nacional em vigor coloca à disposição de
parcela dos brasileiros com capacidade de votar (o eleitor) o direito de participar do processo
de escolha dos candidatos aos cargos de vereadores, deputados, senadores, prefeitos,
governadores e presidente da República. Com isso, os eleitores quando proferem com
discernimento e responsabilidade seus votos nas urnas no dia das eleições, que no Brasil
ocorre de dois em dois anos, se elegem como sendo verdadeiros cidadãos brasileiros e os
eleitos como reais e legítimos representes políticos da sociedade em geral.

Entretanto, parte do eleitorado, quando de forma reprovável e ilegal, por exemplo,
vota em candidatos em troca de algum bem, está colaborando na eleição desses políticos
descompromissados com a coisa pública. Está colaborando com elevação de uma classe
política desejosa em obter suas vantagens econômicas, fazendo da atividade política uma
verdadeira profissão e deixando de lado os necessários compromissos que deveriam se voltar
para o povo, além de criar uma relação de corrupção eleitoral entre o eleitor e o candidato que
se elege sob os auspícios dessa maneira de se eleger.

Serão vistas algumas normas eleitorais brasileiras em vigor que melhor se adéquam à
corrupção eleitoral praticada especificamente pelo eleitor, bem como alguns referenciais
teóricos que melhor se adéquem a essa cultura corrupta por parte do eleitor à vista da
legislação eleitoral brasileira com o fim de se chegar a uma possível conclusão acerca dos
motivos pelos quais há a participação desse eleitorado no processo de corrupção eleitoral bem
como as conseqüências dessa relação existente com o candidato corrupto quando acordam a
venda de voto em troca de um bem qualquer.

1 A venda de voto no contexto legal brasileiro

Todo o processo eleitoral voltado para a escolha dos representantes dos poderes
legislativo (vereadores, deputados estaduais, deputados federais e senadores) e poder
executivo (prefeitos, governadores e presidente da república), está consubstanciado em um
ordenamento jurídico eleitoral próprio.

Como fundamento legal maior a respeito do direito de exercer o voto, a Constituição
Brasileira em seu artigo 14 estabelece os chamados direitos políticos, os quais dão respaldo à
soberania popular quando estabeleceu que essa soberania seja exercida através do voto do
cidadão apto a exercer esse direito.

Nesse sentido, os juristas Velloso e Agra (2010) lembram que esses direitos políticos
estão ligados diretamente à cidadania quando dão ao eleitor a possibilidade de participação
livre das escolhas governamentais, ao tempo em que também serve de sustentáculo legal
maior da ordem jurídica e política nacional não podendo, de qualquer forma, “[...] sucumbir a
pretensões espúrias de facções políticas que queiram desvirtuá-la em prol da obtenção do
poder político e econômico, por meio de práticas de corrupção política.” (BOTELHO, 2010,
p.102).

No caso de corrupção eleitoral, o ordenamento jurídico brasileiro elenca (ou como
dizem os juristas, tipificam) várias condutas praticadas por eleitores brasileiros que passam a
ser consideradas como sendo criminosas quando algumas condutas irregulares são absorvidas
por esse ordenamento. Para uma rápida e melhor compreensão do tema as leis eleitorais serão
contextualizadas, dando maior ênfase à venda de votos a candidatos em períodos eleitorais.

1.1 Legislação penal eleitoral

Afora a Constituição Federal que garante a participação política das pessoas através do
voto, há um arcabouço jurídico que veda e pune as condutas ilícitas eleitorais. Assim, de uma
forma geral, os crimes eleitorais são trabalhados no Código Eleitoral (Lei de nº 4.737/65), na
Lei 9.504/1997, na Lei Complementar de nº 64/1990 e ainda a Lei nº 6.091/1974.

De uma forma rápida, temos que a Lei de nº 4.737 de 15 de julho de 1965, instituiu o
Código Eleitoral Brasileiro e contem normas destinadas a assegurar a organização e o
exercício de direitos políticos precipuamente os de votar e ser votado. A Lei nº 9.504/1997
estabelece normas para as eleições além de elencar vários tipos penais eleitorais. A Lei
Complementar nº 64/1990 estabelece os casos de inelegibilidade (embora remota sua
aplicação na alçada criminal, com a exceção do artigo 25) e a Lei nº 6.091/1974 dispõe sobre
o fornecimento gratuito de transporte, em dias de eleições, a eleitores residentes nas zonas
rurais, todas trazendo em seu bojo definições de condutas que são consideradas como ilícitas.

Em que pese todas essas normas, além de outras que não menos importantes,
definirem tipos penais eleitorais, como o propósito deste trabalho é comentar a participação
do eleitor no processo de corrupção eleitoral, o dispositivo que melhor retrata o assunto é o

encontrado no artigo 299 do Código Eleitoral Brasileiro (2008) já que dispõe especificamente
sobre a venda de votos.

Em se tratando de um crime comum, conforme seja definida como sendo um fato
típico, antijurídico e culpável, em matéria eleitoral, crime eleitoral é uma adequação de um
fato relacionado à matéria eleitoral a uma definição (tipificação) encontrada nessas leis como
sendo proibida. Almeida (2010, p. 426) elenca que “Crime eleitoral é o delito comum (pode
ser cometido por qualquer pessoa) que está tipificado no Código Eleitoral e nas leis eleitorais
extravagantes”. Crime eleitoral é uma adequação de um fato a uma descrição encontrada nas
leis eleitorais, notadamente no Código Eleitoral Brasileiro em seu artigo 299, sendo essa
conduta passível de uma punição.

O Código Eleitoral define vários crimes eleitorais. Entretanto, como já mencionado, o
tipo penal que melhor se enquadra na relação direta com o presente trabalho (corrupção
eleitoral) é o encontrado no artigo 299 do Código Eleitoral quando descreve que “dar,
oferecer, prometer, solicitar ou receber, para si ou para outrem, dinheiro, dádiva, ou qualquer
outra vantagem, para obter ou dar voto e para conseguir ou prometer abstenção, ainda que a
oferta não seja aceita”, descrevendo, através de elementares, a descrição da figura penal
conhecida como compra de voto.

Interessante ressaltar, que há um dispositivo legal encontrado na lei de nº 9.840/99,
especificamente o artigo 41-A basicamente é similar à redação do artigo 299 do Código
Eleitoral, vez que considera como captação de sufrágio quando o candidato doar, oferecer,
prometer, ou entregar, ao eleitor, com o fim de obter-lhe o voto, bem ou vantagem pessoal de
qualquer natureza, inclusive emprego ou função pública. Entretanto, esses normativos (299 e
241-A) não se confundem, uma vez que se prestam a finalidades diferentes, pois enquanto o
artigo 299 do Código Eleitoral é utilizado na seara criminal, o outro dispositivo é usado como
fundamento em ação cível eleitoral.

No que diz respeito à investigação dos crimes eleitorais, de forma bem rápida, a
legislação brasileira, notadamente a Resolução de número 23.222/2010, do Superior Tribunal
Eleitoral, voltada para apuração dos crimes eleitorais, estabelece que cabe a Polícia Federal a
função de Polícia Judiciária Eleitoral, procedendo, nos casos de flagrantes e através de
requisições específicas, as apurações da autoria e materialidade dos fatos praticados contrários
à legislação eleitoral através de Inquéritos Policiais Eleitorais.

Por fim, nos casos de investigação policial eleitoral, eventualmente o Código de
Processo Penal poderá ser utilizado subsidiariamente.

2 Uma cultura eleitoral

Na clássica obra “O Príncipe”, Maquiavel (2007) passou uma mensagem na qual a
política estaria longe do campo da ética e da moral, e que o governante poderia usar o poder
como forma de adquirir proveito pessoal, zelando apenas pelo próprio interesse com atuação
voltada para a manutenção no Poder.

Assim, quando um eleitor vende seu voto a um candidato em troca de um bem
qualquer, como por exemplo, uma quantia em dinheiro, vem à tona o modelo que se extrai e
se interpreta do pensamento de Maquiavel (2007) através da famosa e histórica expressão de
que os fins justificam os meios, significando que não importa o que o gestor faça em seus
domínios como forma de se manter no poder e agir sobre seus governados.

No Brasil, o desvio de dinheiro público, a corrupção, a impunidade, a demora nos
julgamentos de ações envolvendo ações eleitorais são tudo que gira em torno da relação que
se estabelece quando o eleitor participa do processo de corrupção eleitoral juntamente com
parte dos candidatos a cargos públicos em períodos eleitorais. A cultura, a ignorância, a falta
de compromisso com a coisa pública e a falta de ética são processos analisados como
possíveis causas dessa reação promiscua e ilegal da qual o eleitor pode participar.

Interessante as palavras de Botelho (2010, p.132), quando faz um panorama do que
ocorre no Brasil em termos de poder:

Quem não conhece casos em que, ao assumir mandato eletivo, prefeitos e suas
famílias ficam ricos do dia para a noite? Isso é muito perceptível nas cidades do
interior do País e confirma o discurso popular “Se os outros puderem usar e abusar
do dinheiro público, eu também posso”. Há, aliás, eleitores que tacham de burros e
ignorantes aqueles que estiverem no poder e não tiraram nenhuma vantagem da
posição que ocupavam. Depreende-se daí que, infelizmente, os próprios eleitores
apóiam, ora implicitamente, ora explicitamente, os atos de corrupção praticados
corriqueiramente pelos agentes políticos que ajudam a eleger. Nem se percebem,
porém, que os maiores prejudicados com as práticas corriqueiras de corrupção
política são eles mesmos (eleitores), que, ao procurarem a prestação de serviços de
saúde e educação, por exemplo, são submetidos a situações desumanas, humilhantes,
degradantes da sua condição de cidadãos, atribuída constitucionalmente.

É como se o eleitor que vende o voto tivesse adormecido no uso de suas razões
políticas e assim não sentisse o realizar de suas ações nem tampouco as conseqüências dessas,
ao tempo que fica claro que o mesmo é produto de uma cultura que de alguma forma
dissemina e influencia os sistemas e comportamentos desses membros sociais. É tanto que a
cada período eleitoral chuvas de denúncias envolvendo compra e venda de votos são
constantemente divulgadas pela imprensa em geral, numa clara demonstração de que isso
ocorre em toda eleição, admitindo-se, portanto, uma total e irrestrita participação e tolerância

de parcela dessa sociedade que age como que se aproveitando do momento eleitoral para
auferir vantagens as mais variadas possíveis.

Esse fenômeno é tão evidente que no período eleitoral de 2008, a título de exemplo, na
cidade de João Pessoa, capital da Paraíba, o site eletrônico “Paraíba1” publicou reportagem
informando que várias pessoas foram às ruas cobrar investigação sobre determinado
candidato que oferecera certa quantia em dinheiro a vários eleitores em troca de votos.
Entretanto, como o candidato não “cumpriu” o acordo (pagamento da quantia) essas pessoas
foram às ruas protestar pelo calote eleitoral (2008).

Para corroborar com isso, o Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (2006)
realizou entre os dias 12 a 16 de janeiro de 2006 uma pesquisa com o fim de estudar opiniões
relacionadas a assuntos de corrupção e ética, onde, dentre vários dados surpreendentes, ficou
demonstrado que desvios de condutas dos governantes, como contratação de parentes e
transformação de viagens de serviço em lazer, são considerados normais pelos eleitores
entrevistados (IBOPE, 2006).

Na esteira dessa cultura, os próprios órgãos encarregados de combater a corrupção
eleitoral ficam como que amordaçados pela falta de colaboração dos envolvidos nessa relação
corrupta que se estabelece entre eleitor e candidato. A dificuldade maior reside no fato que a
negociata do voto feita pelos envolvidos geralmente acontece em lugares e momentos longes
dos olhos das autoridades, como exemplo no interior das casas dos próprios eleitores.

Por fim, no que diz respeito à corrupção, é completamente oportuno trazer para este
trabalho o que escreveu Martins (2005, p.146) em sua obra O Dinheiro Sujo da Corrupção,
que menciona:

O debate “político honesto ou político corrupto” é um falso debate, porque é a
estrutura social brasileira semi-escravagista, entre o regime de castas indiano e o
apartheid social, que engendra a corrupção. Sem uma corajosa reforma das infra-
estruturas econômicas e sociais brasileiras, capaz de anular a atual situação legal de
injustiça e desigualdade, novos escândalos surgirão, pois a corrupção se tornou um
componente da cultura brasileira.

Sendo a corrupção eleitoral um elemento da cultura brasileira, de acordo com a
autora acima, a venda do voto nos períodos eleitorais é mais um fator que corrobora com a
assertiva mencionada. A corrupção eleitoral se alastra durante a história político-eleitoral do
Brasil, desaguando no pensamento do eleitor e do candidato como uma demonstração clara de
que o fenômeno faz parte nitidamente do quotidiano do brasileiro que fecha os olhos para as
reais consequências desse fenômeno, como restam das palavras de Boulos Júnior (2009, p.
55):

O coronel conseguia o voto do eleitor de duas formas: a) por meio da violência: caso
o eleitor “traísse”, votando em outro candidato, podia perder o emprego ou ser
surrado pelos capangas do coronel; b) pela troca de favores: o coronel oferecia a
seus dependentes “favores”, como uma sacola de alimentos, remédios, segurança,
vaga no hospital, dinheiro emprestado, emprego etc. Em troca desses “favores”,
exigia que os eleitores votassem nos candidatos indicados por ele. Quando, apesar
disso, perdia a eleição, o coronel praticava a fraude eleitoral: falsificação de
resultados, roubo de urnas, inclusão dos votos de crianças, de defuntos, de pessoas
inexistentes etc.

A história mostra que a relação estabelecida entre o eleitor e o candidato se
estabeleceu de modo viciado desde as origens da sociedade brasileira. Há registros de que a
força exteriorizada através da violência, as relações pessoais estabelecidas com a troca de
favores e as irregularidades existentes através das fraudes nas eleições fincaram bases nos
processos eleitorais que permanecem até os dias atuais.

3 Causas e reflexos

Diante do que foi dito até aqui, resta listar as possíveis causas que levam o eleitor a
vender seu voto em troca de, por exemplo, um pneu de carro, uma passagem de ônibus, uma
bolsa de estudo, dentre outras condutas, a se corromper levianamente em troca de um quase
nada, e, assim, colocar em crise todo o sistema político-eleitoral próprio da democracia
brasileira, bem como as conseqüências oriundas da corrupção eleitoral no processo sócio-
político brasileiro.

Inicialmente, deve ser ressaltado que parte do eleitorado brasileiro se acomoda
emocionalmente em períodos eleitorais em favor de determinada ala partidária, chegando ao
contorno da emoção pura. Isso acontece tendo em vista as dependências que se estabelecem
entre os eleitores e os candidatos, notadamente nas pequenas cidades do interior, onde as
pessoas praticamente se dividem ao meio através de vertentes de famílias tradicionais da
cidade envolvida na disputa eleitoral. Pode-se chegar ao ponto de transformar as disputas
eleitorais em verdadeiros campos de guerra, inclusive com a necessidade de reforço policial
em várias localidades do país.

Um outro fator que possivelmente leva à corrupção eleitoral por meio da compra (pelo
candidato) e venda (pelo eleitor) do voto é a dependência que nutre um número muito grande
de eleitor para com os candidatos. Essa dependência está na base das necessidades
econômicas dos eleitores que têm durante o processo eleitoral uma ocasião de ganhar alguns
trocados em troca do voto. É tanto, que alguns governantes, sabendo que a dependência é
fator decisivo nas eleições, alimentam suas campanhas de programas socais os mais variados

possíveis, como por exemplo, o programa Bolsa Família. Essa assertiva é corroborada nas
palavras de Lavareda quando, a título de oportuno exemplo, deixou claro que “[...] é, mais ou
menos, como se o programa Bolsa Família do governo Lula prescindisse da propaganda
oficial e depois, igualmente, seu uso na propaganda da campanha [...]” (LAVAREDA, 2009,
p.137).

A insistência em desobedecer as leis brasileiras parece ser um outro ponto a ser
considerado na presente discussão. É como se o ordenamento jurídico fosse feito para ser
realmente desobedecido. Assim, a proibição de venda do voto por parte do eleitor é um
fenômeno social que não choca o eleitor corrupto. Aliás, esse eleitor chega a muitas vezes
participar ativamente das negociatas envolvendo a venda do voto. Nesse sentido, o
antropólogo Roberto da Mata, em sua obra Fé em Deus e Pé na Tábua (2010), quando aborda
a temática dos acidentes de trânsito no Brasil, sintetiza dizendo que as raízes do problema
reside nessa dificuldade de seguir as leis que regem o assunto (na obra, o trânsito), mas que
pode ser perfeitamente enquadrado na nesta temática.

Além disso, tendo em vista ser o Brasil ainda novo, com origem características de uma
colônia de exploração de Portugal que servia apenas para abastecer os buchos dos
portugueses, tem-se que a prática de venda de votos tem respaldo ainda no antigo sistema do
coronelismo, onde os chefes das cidades eram quem determinam tais práticas, numa clara
demonstração de que tudo isso está ligado a um processo educacional pobre e deficiente, onde
as escolas públicas não funcionam e as particulares apenas objetivam seus lucros financeiros.

Alinhado a tudo isso, não há dúvida de que a visão que o eleitor brasileiro tem com
relação aos grandes casos de corrupção (como já visto) é a de que os envolvidos não chegam a
ser punidos por suas práticas ilegais. Pelo contrário, além de não responderem, seja em
âmbito criminal, seja em âmbito cível eleitoral, sempre continuam se alternando no comando
dos vários escalões burocráticos do Poder.

Quando os corruptos chegam a ser interpelados pelas garras do Estado, através dos
vários órgãos envolvidos no combate à corrupção eleitoral ou até nos processos e julgamentos
de ações cíveis eleitorais (AIME, AIJE, etc) não são punidos, deixando, assim, patente a
marca da impunidade reinante no Brasil dos poderosos, tudo funcionando como incentivo às
práticas ilegais.

Como consequências dessa corrupção eleitoral, tem-se que a principal delas é tornar
vulgar a prática da venda de voto em troca de uma ninharia qualquer bem como a legitimação
de políticos que não têm a mínima consideração e respeito pela coisa pública, gerando daí
práticas corruptas que assolam a Administração Pública brasileira que passa a repercutir

diretamente nas ações sociais que deveriam ser implementadas e voltadas para o combate a
fome, a pobreza, a exclusão social e a falta de escolas adequadas e necessárias, dentre outras.

Elegendo políticos corruptos e descomprometidos, os eleitores colaboram com as
práticas de não dar importância devida a vários direitos, sobretudo os necessários ao mínimo
de vida digna das pessoas brasileiras, como a saúde, a educação e o combate à violência que
tanto assombra a vida de qualquer brasileiro.

Esses direitos básicos e necessários, diga-se de passagem, constitucionais, pois a
Constituição Federal atual garante o direito à saúde (artigo 196), o direito à educação
(estabelecido no artigo 205) e à segurança (artigo 144), deixam de ser executados tendo em
vista que a corrupção transfere recursos que deveriam ser aplicados nessas áreas e são
desviadas para os cofres particulares de pessoas envolvidas com a corrupção.

Mais uma das diversas consequências advindas da corrupção são os impactos na
economia brasileira, inclusive sobre o PIB nacional, onde cifras astronômicas são desviadas
dos cofres públicas e acabam direto nas malas e meias da corrupção, deixando, de, por
exemplo, serem resolvidos vários déficits, como as vagas nas penitenciárias, nas escolas
públicas e o habitacional, aprofundando cada vez mais a exclusão social e a desigualdade que
paira entre os ricos e os pobres.

No que diz respeito à repercussão da corrupção na seara mundial, um grande fato que
ocorre é a imagem negativa do país associada à corrupção e à falta de punição dos corruptos
envolvidos. Isso se reflete sobretudo nos fatores de risco de investimento no Brasil e também
às dificuldades de obtenção de financiamentos exteriores, pois vários organismos
internacionais passaram a, de uns tempo para cá, fazer varreduras no que diz respeito ao
assunto em todas as partes do planeta, como é o caso do Escritório das Nações Unidas contra
Drogas e Crimes (UNODC), que inclusive já realizou estudos relacionados à corrupção e suas
conseqüências, e o Banco Mundial que apoia iniciativas de governos no combate à corrupção.

Sem necessidade de se alongar nas inúmeras conseqüências advindas da corrupção
eleitoral da qual o eleitor participa as principais são de ordem política, cultural, de segurança
e, por fim, econômica, pois se nota claramente uma adequação de uma cultura permissiva no
quotidiano da sociedade brasileira.

Considerações finais

A corrupção eleitoral, no que diz respeito a venda de voto, está diretamente ligada ao
eleitor que faz parte desse processo de corrupção. O eleitor é peça fundamental na relação que

se estabelece com os candidatos corruptos, criando dessa forma uma forte ligação entre as
peças necessárias para completar esse sistema: o eleitor, o candidato e o objeto negociado.

Tem-se que a venda de voto por parte do eleitor em período eleitoral em troca de um
bem qualquer (por exemplo, a entrega de uma prótese dentária) se encaixa perfeitamente nos
casos de corrupção eleitoral. Aliás, a corrupção eleitoral é tema amplo que se estabelece de
várias modalidades e que nessa relação o objeto que se negocia com o candidato tem a mais
ampla variação possível. Esse objeto sofre uma variável apenas quanto ao valor que se
negocia e a depender da classe social a qual pertence o eleitor em questão: na classe menos
privilegiada, a doação de um óculos ou um par de sapato cai muito bem; no seio da classe
média, a doação de uma bolsa de estudo, não tem igual; numa classe mais privilegiada
economicamente, não se pode deixar de lado uma negociata envolvendo casos de licitação,
contratos, e, em fim, um objeto, digamos, mais desejável e, quem sabe, mais lucrativo.

Essa relação perigosa (já que provoca graves conseqüências) envolvendo a temática
corrupção eleitoral parece está imiscuída nas mentes de grande número de eleitores brasileiro,
numa crença de que o Brasil passa por momentos graves no que se refere à corrupção e que
essa prática percorrerá longos caminhos. Para Martins (2005) a tentação das vantagens do
poder sempre existirá e sempre terá de ser combatida – não só no Brasil, mas em qualquer
outro lugar do mundo.

Nesse sentido, restam apenas aos brasileiros suas representações oficiais (Poder
Judiciário, Polícia Judiciária, Ministério Público, Tribunal de Contas da União) e as
esperanças no combate à corrupção eleitoral. Estudar formas de combate a esse mal com o
fim de se chegar aos meios de evitar e apurar condutas ilícitas, tanto no âmbito criminal
quanto no âmbito cível eleitoral. Agindo dessa maneira, a corrupção eleitoral passaria a ser
vista não como uma ação isolada, mas como ações organizadas com estrutura apropriada,
exigindo do aparato estatal todos os recursos disponíveis no seu combate à criminalidade
eleitoral e rastreando doações suspeitas: monitoramentos em geral, quebras de sigilos, outras
medidas cautelares etc.

Some-se a isso, a junção de esforços de todas as representações governamentais e não
governamentais no combate a essa chaga, tais como o Poder Judiciário, a Polícia Federal
(como polícia judiciária eleitoral), o Tribunal de Contas da União, o Ministério Publico, a
Receita Federal do Brasil, a Controladoria-Geral da União, ONGs, o Banco Mundial, a
imprensa, as igrejas (quem não se lembra da conhecida Lei do Bispo) e os movimentos
voltados à cidadania, entre outros, é uma necessidade vital ao combate à corrupção eleitoral e
assim ter um Brasil realmente justo.

Por fim, procurou o presente trabalho, quando deu ênfase aos atos de corrupção
praticados por eleitores e candidatos, notadamente através da negociação de votos, contribuir
com o mundo acadêmico e quem sabe com os especialistas no assunto, no sentido de se
estudar meios que efetivamente combatam a corrupção eleitoral como chaga que assola o
Brasil. Serve também como meio de tentar chamar a atenção para esse fato que causa
inúmeras conseqüências nas diversas áreas da Administração como um todo, encorajando os
especialistas no assunto a se dedicarem aos estudos de criação de reformas aptas a minimizar
essa situação, sobrando para esse eleitorado corrupto apenas uma cultura permissiva e
dormente.

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