A comissão especial da
Câmara dos Deputados que discute a maioridade penal aprovou nesta
quarta-feira (17), por 21 votos favoráveis e 6 contrários, o relatório
do deputado Laerte Bessa (PR-DF) que reduz de 18 para 16 anos a idade
penal para os crimes considerados graves.
O relatório original
previa a redução para todos os casos, mas, após acordo entre os
partidos, o texto foi alterado para prever punição somente aos jovens
que cometerem crimes hediondos (como latrocínio e estupro), homicídio
doloso (intencional), lesão corporal grave, seguida ou não de morte, e
roubo qualificado.
A alteração é fruto de
uma negociação capitaneada pelo presidente da Câmara, Eduardo Cunha
(PMDB-RJ), com o PSDB e lideranças de outros partidos numa articulação
para derrotar o PT, contrário à redução da maioridade.
A nova redação do texto não prevê mais a realização de um referendo popular sobre o tema, como constava no documento inicial.
Cunha já avisou que
pretende votar o relatório no plenário principal no próximo dia 30. Por
se tratar de uma proposta de emenda à Constituição (PEC), a matéria
precisará de, no mínimo, 308 votos para ser aprovada. Se passar, ela
terá ainda que ser votada em segundo turno na Câmara e depois em dois
turnos no Senado.
Os únicos parlamentares a
votarem contra a redução da maioridade penal foram os deputados
Margarida Salomão (PT-MG), Maria do Rosário (PT-RS), Arnaldo Jordy
(PPS-PA), Tadeu Alencar (PSB-PE), Weverton Rocha (PDT-MA) e Érika Kokay
(PT-DF). Foi aprovada ainda a inclusão de um trecho que estabelece que
os governos vão ter que criar políticas de atendimento aos jovens
infratores.
Sessão tumultuada
Com bate-boca e
provocações dos dois lados, a sessão foi realizada em um plenário
lotado. Apenas deputados, assessores parlamentares e profissionais de
imprensa tiveram o acesso liberado. Do lado de dentro, era possível
ouvir o barulho dos apitos, as vaias e os gritos de “fora, Cunha” e “não
à redução” dos manifestantes, que se aglomeravam do lado de fora.
No plenário, os
discursos se alternavam a favor e contra o relatório. Ao apresentar as
mudanças no seu texto, Bessa, que é ex-delegado de polícia, fez uma
defesa inflamada da redução da idade penal. “O cidadão de 16 anos sabe
muito bem distinguir entre o que é um ato lícito e um ato ilícito. Não
podemos dizer que um menor de 16 anos é inimputável, isso é um absurdo”,
afirmou.
Ele lembrou ainda a sua
atuação como policial e disse que quem hoje se diz contrário à redução é
porque “nunca esteve na rua para enfrentar um bandido”. “A minha
convicção não é só baixar de 18 para 16 anos. Queria pegar mais um
pouco, uma lasca desses criminosos, bandidos”, declarou.
O deputado Delegado Éder Mauro (PSD-PA) disse que preferia “encher a prisão de bandido do que o cemitério de gente inocente”.
Diante da demora para a
votação, o governo federal mobilizou uma força-tarefa para acelerar a
aprovação do relatório. O líder do governo, José Guimarães (PT-CE), e o
ministro Eliseu Padilha (Aviação Civil), próximo da articulação política
do Planalto, foram até a comissão acompanhar os trabalhos e, de tempos
em tempos, conversavam ao pé do ouvido do presidente da comissão, André
Moura (PSC-SE).
O temor do governo era
que a comissão atrasasse a votação da pauta do plenário principal, que
tem na fila o projeto de lei sobre as desonerações nas folhas de
pagamento, parte do ajuste fiscal. Pelo regimento da Câmara, quando os
trabalhos no plenário têm início, as comissões ficam proibidas de votar
qualquer coisa.
Deputados contrários à
redução da maioridade penal acusaram a comissão de querer atropelar a
discussão e votar a matéria na pressa. O deputado Weverton Rocha
(PDT-MA) reclamou que os trabalhos no colegiado foram apressados após
Cunha anunciar na sua conta no microblog Twitter que votaria o relatório
no plenário no final do mês.
A deputada Margarida
Salomão (PT-MG) tentou argumentar que a medida terá pouco efeito prático
para reduzir os problemas de segurança. “Todos nós desejamos que
diminua a violência na sociedade. No entanto, dada a insignificância
estatística da participação de jovens, penso que a redução é uma medida
inadequada”, afirmou.
“A bala não resolve
tudo”, protestou a deputada Érika Kokay (PT-DF). Darcísio Perondi
(PMDB-RS) acusou os parlamentares favoráveis à redução de “populismo
penal”. “Vocês serão cobrados na próxima eleição [pela redução dos
índices de violência]. Vocês estão vendendo algo que não vão entregar”,
alertou.
“Eu não quero que a
sociedade se sinta segura sem estar. Eu quero garantir segurança pública
para todos”, argumentou Alessandro Molon (PT-RJ), alegando ainda haver
inconstitucionalidade na proposta, uma vez que, na sua visão, altera uma
cláusula pétrea da Constituição, como são chamados os direitos
considerados fundamentais que não podem ser mexidos.
Em outro momento de
ânimos acirrados, o deputado Sérgio Vidigal (PDT-ES), crítico à redução,
alfinetou os parlamentares com carreira policial ao declarar que, na
Câmara, não havia “delegado, capitão ou coronel”, mas que ali todos eram
deputados. A declaração foi rebatida de pronto por vários
parlamentares. “Que babaquice é essa? Está querendo aparecer?”,
questionou Alberto Fraga (DEM-DF), coronel da reserva da Polícia
Militar.
Tensão
Antes mesmo do início da
sessão, o clima já era de tensão. Por conta do tumulto na reunião
anterior do colegiado, que teve até spray de pimenta, o acesso do
público ao plenário da comissão foi proibido. Nos corredores que levam
às salas das comissões, seguranças isolaram a passagem e só liberaram o
acesso para parlamentares, servidores credenciados e imprensa.
Houve bate-boca quando
foi notada a presença da presidente da União Nacional dos Estudantes,
Carina Vitral, que, em princípio, não poderia acompanhar a sessão do
plenário. Aos brados, deputados pediram a saída dela. O presidente da
comissão, André Moura (PSC-SE), porém, decidiu autorizar a sua
permanência desde que ficasse atrás do cordão de isolamento.
Polêmico, o tema
mobilizou os deputados de diversos partidos, que compareceram em peso à
comissão. Cinco das seis filas do plenário foram ocupadas pelos
parlamentares, algo incomum no dia a dia das comissões.
Logo no início, o
deputado Alberto Fraga (DEM-DF) fez uma manobra para garantir a votação.
Embora favorável à redução, ele apresentou um requerimento para retirar
o tema de pauta, sabendo de antemão que os deputados ligados à área de
segurança pública, presentes em maior número na sessão, conseguiriam
derrubar o requerimento.
A medida foi uma
estratégia para evitar que novos requerimentos, que pudessem atrasar a
votação, fossem apresentados por partidos contrários à redução. A
deputada Maria do Rosário (PT-RS) reagiu, mas o requerimento de Fraga
acabou rejeitado por 21 votos contrários e 6 favoráveis e, assim, a
votação continuou.
Para acelerar a votação,
foi aprovada ainda a inversão de pauta, por um placar idêntico de 21 a
6, o que permitiu que fossem puladas etapas burocráticas, como a leitura
da ata, e se passasse diretamente à discussão e votação do relatório.
G1
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